Comportamentos-problema podem variar de indivíduo para indivíduo, em
pessoas com retardo mental grave [em sua maioria] a ocorrência é mais acentuada, e,
nestes indivíduos os comportamentos-problema se apresentam mais frequentemente em
forma de agressão e hiperatividade. Este é um dado que merece atenção, sabendo-se
que a agressão e a hiperatividade podem inibir ou obstar a inserção destes indivíduos
em ambientes menos restritos.
È comum lidar com eles [os comportamentos-problema] através de
gerenciamento processual de contingências desde reforço diferencial para
comportamento adequado a time-out. No entanto, há uma ressalva em relação a este tipo
de procedimento, pois embora a sua eficácia tenha sido mostrada na literatura, ele
requer perícia em sua condução. Mesmo assim quando estes procedimentos são
conduzidos adequadamente, os efeitos podem ser alterados pela imprevisibilidade do
ambiente. Um complemento para a intervenção comportamental pode ser a inclusão de
atividades físicas, como, por exemplo, exercícios aeróbicos, exercícios de correr, de
nadar e etc. Na literatura há inúmeros exemplos demonstrando os efeitos benéficos das
atividades físicas nos comportamentos-problema em pessoas com Transtornos Globais
do Desenvolvimento (TGD) de diversas idades.
Visto isto, o objetivo do estudo em questão é o de explorar sistematicamente os
efeitos de exercício físico em 10 pessoas com retardo mental bem grave e que
apresentavam comportamentos-problema como agressão e bastante hiperatividade e
que não responderam adequadamente aos programas típicos de gerenciamento
processual de contingências. Foi elaborado um método para avaliar os efeitos dos
exercícios físicos no decorrer de alguns dias ao invés de apenas por um período limitado
de tempo logo após o exercício. Além dos pontos positivos óbvios decorrentes da
observação prolongada, ela se faz necessário porque embora os participantes
apresentassem comportamentos-problema intensos, eles não eram frequentes, e, também
se fez necessário empregar um sistema de observação diferente do usual.
Para aumentar a confiabilidade dos dados deste estudo os autores fizeram um
experimento (com seis participantes) e depois um segundo (com quatro participantes),
com um total de 10 participantes. Para facilitar a compreensão, serão apresentados aqui
os estudos de forma mais aglutinada, visto que o método foi quase idêntico nas duas
situações experimentais.
Fizeram parte deste estudo 10 participantes sendo 6 do sexo masculino e 4 do
feminino. Todos residiam em uma casa de campo especial que prestava serviços a esta
população.
Dos participantes do primeiro experimento: cinco estavam recebendo medicação
em função dos comportamentos-problema que apresentavam; tinham uma média de 22
anos de idade (de 15 a 25), tinham retardo mental muito grave (média de idade mental
de 2,1 anos [variando de 1,5 a 2,8 anos] de acordo com o Vineland Social Maturity
Scale ou a Escala de Maturidade Social Vineland
Dos participantes do segundo experimento: quatro estavam sendo tratados por
variações de reforçamento diferencial e time-out e dois participantes estavam recebendo
medicação; tinham em média, 17,6 anos de idade (de 12 a 19 anos), três tinham retardo
mental grave e um tinha retardo mental moderado (de novo, de acordo com a Escala de
Vineland tinham idade mental em média de 6 anos [5 a 7,4 anos].
Todos os 10 participantes estavam em excelente saúde física, não tinham algum
comprometimento motor e receberam permissão de seus respectivos médicos para
participarem do programa de exercícios físicos.
Definiu-se como agressão:
· Bater;
· Esbofetear/dar tapas;
· Chutar; ou
· Abalroar outro residente ou profissional;
Definiu-se como hiperatividade:
· Andar Rápido ou Correr; ou
· Qualquer movimento do corpo que aparentasse perturbar o ambiente, como derrubar algum móvel, por
exemplo.
Vale lembrar que estes comportamentos ocorriam com frequência relativamente
baixa (duas a três vezes ao dia cada participante). Assim, a frequência da ocorrência
destes comportamentos não era o problema e sim a intensidade dos mesmos. A
intensidade foi definida tanto pela força física empregada quanto pelas consequências
sociais do episódio. Para registrar a intensidade dos comportamentos de agressão e/ou
hiperatividade foi elaborada uma escala de 1 a 5, sendo que (1) não é um problema,
(2) um problema ocasional, (3) um problema moderado, (4) um problema grave e (5)
um problema que requer atenção imediata. Uma escala foi preenchida para agressão e
outra para hiperatividade.
Seis avaliadores foram utilizados: dois educadores e dois profissionais da casa
de campo um do turno diurno e outro do noturno. Todos estes avaliadores tinham
contato com os participantes a todo o momento e em todos os ambientes.
A rotina do dia a dia dos participantes consistia em quatro horas em sala de aula
e oito a dez horas nas suas unidades residenciais. Praticavam como parte da rotina
diária, exercício que era normalmente caminhar entre as unidades e a escola e também
acesso a uma área de recreação por 30 minutos à tarde.
Para o grupo do primeiro experimento, o procedimento do tratamento tinha dois
períodos de 45 minutos cada durante a semana às 11h00min e às 16h00min em uma
grande área com gramado [com pouco mais de 4 mil m²]. Durante o período de
exercício dois terapeutas (um dos autores e outro indivíduo) permitiram aos
participantes fazer o que quisessem desde que continuassem se movimentado em um
passo mais rápido do que o andar usual. Se um participante diminuísse o passo ou
sentasse, lhe seria gentilmente solicitado que voltasse ao exercício. Na prática, os
participantes prontamente correram no perímetro da área de exercício, fazendo com
que incitações ou solicitações fossem desnecessárias. O procedimento durou 35 dias.
Para o segundo grupo, a rotina diária era de seis horas em ambiente educacional
e o restante do dia era ocupado em atividades de lazer e cuidados da saúde. Já neste
grupo ocorriam concomitantemente tanto atividades do dia a dia quanto de tratamento
[ocorriam no mesmo horário que o outro grupo, mas em locais diferentes] para que as
avaliações fossem o máximo possível independentes do avaliador. No entanto, nas
sessões que não faziam parte do tratamento os participantes engajavam-se em
atividades mais calmas como sentar, conversar e andar vagarosamente com os
terapeutas. Durante as sessões de exercício/tratamento, os participantes eram
incentivados e reforçados pelos terapeutas para correrem com tenacidade, jogarem
basquetebol ou pularem na cama elástica. O grau de participação dos mesmos variou
de acordo com as atividades, mas ninguém se mostrou resistente aos exercícios, ou
apresentou comportamento indesejável durante tais sessões. Eles foram cautelosamente
acompanhados, observando-se a ocorrência de sinais de fadiga física e quando
aparentavam estar cansados eram convidados a descansar.
Para o primeiro grupo, em quatro dos seis participantes o aumento dos exercícios
físicos mostrou-se um procedimento eficaz para reduzir o seu grau na avaliação de
agressão e hiperatividade. Para os mesmos, as avaliações diminuíram de “um problema
precisando de atenção imediata” para “um problema moderado” ou “um problema
moderado” para um considerado ocasional ou resolvido. O segundo grupo também
obteve efeitos semelhantes. Este não foi o caso para os dois restantes que obtiveram
algum proveito, mas não considerável. No entanto, isto não é surpreendente visto que
foram os que receberam menos tempo de intervenção e também porque não foi
postulado que o objetivo desta intervenção seria ter efeitos universais nos
comportamentos-problema que são mantidos por mecanismos motivacionais
amplamente divergentes. E, mais adiante, todos os participantes foram beneficiados no
sentido em que as atividades físicas promoveram bem-estar físico.
Estes dados podem ser considerados promissores frente aos efeitos obtidos com
a maioria dos participantes cujos problemas graves não haviam respondido
apropriadamente aos esforços de outras intervenções, e, outro ponto favorável é a
relativa facilidade e economia na condução desta intervenção. Além disso, esta
intervenção não usou procedimentos coercitivos ou restritivos, precisou de pouco
treinamento tanto para a equipe de profissionais quanto para os participantes e foi
conduzida no tempo-livre que antecedeu o estudo, e, portanto, não interferiu na rotina
dos programas da instituição.
A partir dos dados observados aqui se fazem necessários outros passos para
futuras pesquisas, como variar intensidades e/ou tipos de exercícios e talvez o(s)
efeito(s) de outras classes de respostas. Por exemplo, é possível que exercícios sejam
mais indicados para tratar problemas que não aparentam ser mantidos socialmente,
isto é não são mantidos principalmente pelos seus efeitos sociais em termos de atrair ou
afastar outras pessoas. Também seria interessante utilizar outros métodos de colheita
de dados, além da observação direta, pois podem não ser práticos, ou podem não
propiciar um quadro válido da intensidade do comportamento para definir sua
significância clínica.
Nenhum comentário:
Postar um comentário